quinta-feira, 17 de setembro de 2009

CTRL+ALT+DEL



No canto inferior direito da tela, o relógio anuncia que são 02h35min min. David não nota, tampouco lhe interessa tal informação. O quarto, pequeno, e os cartazes de “Starwars” distribuídos por suas paredes, revelados pela parca luz vinda de um monitor de dezessete polegadas, são como o mundo paralelo criado por autistas. Simplesmente não existem...


A cama ainda feita por sua mãe no dia anterior e os livros de Harry Potter sobre o bidê são desdenhados pelo jovem. Há mais de oito horas seu único habitat, era a cadeira, posta na escrivaninha onde seu fiel amigo, um computador dos mais modernos, ganho no último natal, lhe aguardava ansiosamente.
Iniciava sua rotina, nas redes sociais, em conversas pelo Messenger, atualizando seus três blogs. Aproveitava também certo tempo para ler e-mails, e buscar novidades na rede, para somente após ter a certeza de ser o único ser vivo ainda acordado no apartamento dividido com seus pais e sua avó materna, é que o garoto trocava de interesses.
E era justamente neste momento, que parecia despregar-se do mundo real. Seu corpo não movia sequer um músculo, exceto os dos seus lábios, movendo-se insinuando um gesto de fome. Deveras, trazia seu aspecto ar faminto, desejando o impossível, e invadir o streaming do vídeo.
Como era bela aquela mulher. Sem pudor algum, e com uma mensalidade de U$$ 9,95, debitados automaticamente de sua conta paypal, ela despia-se vagarosamente, revelando pouco a pouco suas curvas voluptuosas. Seus lábios carnudos mordiscavam a ponta de seus dedos... Chupava-os... Olhava diretamente para o aparelho que lhe levava quem sabe a uma centena de milhares de casas. Mas para David, era para ele que ela se entregava. Tirando o sutiã, sem antes de realizar duas dezenas de movimentos sensuais, e outra dezena de ameaças até finalmente revelar dois belos montes de bicos rijos. Seria excitação, ou o ar-condicionado da sala cercada de diretores? Para David, isto não importava.
Queria mesmo e vê-la nua. E isto estava cada vez mais próximo. As mãos da donzela, fina, delicada, e de dedos longos, suavemente passeava por seu ventre... Seu umbigo... E furtivamente invadia o algodão branco que cobria suas partes íntimas... David podia sentir seu calor, seu sabor, seu cheiro... Mais uma vez ameaçava revelar-se por inteiro. David aguardava por isso. Sua bermuda era incapaz de conter a excitação de seu corpo... “Vadia”! Sussurrava o jovem, num misto de xingamento e pedido para ela despir-se logo...
No entanto vieram novas ameaças. Mas nada de ficar nua. Seus olhos refletiam sacanagem. Seus dedos convidavam a câmera... Convidavam David para entrar no computador.
Como recriminar sua distração. Qual de nós não cometeria mesmo engano com tais imagens. Seus pêlos pubianos surgiam... Como poderia David ver a mensagem do antivírus? A calcinha como uma caixa de chocolates que se abre vagarosamente, descia roçando em suas coxas grossas. Numas das mãos o pano branco era retirado, com a outra tocava carinhosamente seu próprio sexo. Não a como culpar David por não perceber o cabo USB ganhando vida, e serpentear pelo ar, em busca de seu corpo. Conectando-se violentamente em seu cérebro... Eu mesmo não perceberia.
Ele praguejou apenas pelo emaranhado de estática que invadiu o monitor, levando embora sua amada. A tela parecia ganhar vida e perder-se no nada... “Seria algum vírus?” Questionou-se. Sabia ela que não havia tempo. CTRL+ALT+DEL, fosse talvez sua única salvação... Dele e de seu fiel amigo... O jovem não hesitou. Dois dedos da mão esquerda e um na direita pressionam o teclado com extrema raiva...
Era tarde. Tudo se apaga. Até mesmo David.

sábado, 12 de setembro de 2009

O Contato

Não há paisagem mais bela que o coração do Rio Grande. Principalmente naquele cantinho de cidade, cujo nome não soa bem, e que muito se distancia de pântano. É o meu sítio, modesto, pequeno, mas que noutra parte, beleza de céu não existe. Os altiplanos que me cercam, formam uma abóboda estrelada, cuja noite limpa revela toda a magnitude de um universo, onde somos miniaturas. É verão, e faz calor...

que se alivia com a brisa que toca o rosto, enquanto olho para cada ponto cintilante, como se buscasse qualquer resposta. Não há luar, tampouco nuvens. Apenas a imensidão, e as estrelas que a firmam. As folhas da uva-do-japão dançam vagarosamente, com um vento incapaz de despentear-me. Trago um gole da cerveja posta aos pés da cadeira, e relembro de Jane. Linda mulher... Linda mulher... Mas um clarão furta-me doce lembrança. É um risco que rasga a tranquilidade da paisagem cuspindo línguas de fogo. Meus cabelos negros esvoaçam ao vento provocado por tal fenômeno. O raio incandescente tem seu fim ao encontro de um bosque, na parte baixa de minha propriedade. Terá sido algum avião, caído como um pássaro atingido? Pergunto-me. Empunho a espingarda e uma lanterna. Jagunço, meu fiel amigo de quatro patas segue-me. Preciso ver o que se trata, e mais do que nada ver se posso auxiliar, seja o que for que tenha se espatifado em minhas terras. Uns oitocentos metros em declive nos separam. Uma caminhada de seis ou sete minutos em passos largo. Ao me aproximar vejo que fagulhas consomem as folhas das árvores que serviram de leito aos acidentados. O cão brada... Fica arredio, e sem mais nem menos ameaça recuar... O terreno está ferido... A terra atingida forma um ninho forçado pelo objeto que se entranhou em seu leito... Meu amigo, relutante, agora tenta impedir-me de continuar. Que espécie de homem seria eu, se o obedecesse? Subi pela elevação formada. O chão estava quente. A fumaça tomava rumo ao céu... Ao atingir o ápice de altura, um buraco de dezenas de metros de diâmetro apresentava-se. No seu interior uma aeronave que jamais vira na televisão estava em chamas, mas surpreendentemente inteira. Algum experimento americano. Concluí. Um impulso humanitário fez-me passar sobre meus medos, e ir até ela socorrer seus pilotos. Por sorte, poderiam ainda estar vivos. Uma porta entreaberta deu-me acesso á aeronave. Era de um tamanho incomum. A galeria era maior que minha casa. Com passos lentos e delicados caminhei por seu corredor metálico, até apresentar-se a mim, a sala de pilotagem, onde três pilotos agonizavam... Produziam eles um odor fétido. Daí a repulsa de meu amigo, com olfato mais sensível. Eram criaturas horrendas que guiavam tal aparelho. Cada um possuía três pernas, cinco braços, uma cabeça ornada por um único olho enorme, e seus trajes violentados pelo choque revelavam sua pele escamosa e prateada... Mais não conseguirei descrever. Quando um deles apontou-me, com um de seus braços esticados apontando em minha direção, meu coração já atemorizado, entrou em grave conflito, sem saber se aquele gesto significava uma sentença, ou um pedido de ajuda. Na dúvida gastei cada cartucho de minha espingarda em suas cabeças, explodindo-as como frágeis melancias. Só parei de atirar quando tive a certeza que estavam todos mortos, e que eu enfim estava salvo.