terça-feira, 29 de abril de 2008



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Fazia certo tempo que minha esposa apresentava tal proposta, e eu seguia relutante. Nuncafui destes que detestam animais, no entanto sempre tive certa cisma com gatos. Até mepediam explicações, um motivo para tal receio. Na verdade não tinha nada, nenhumaresposta, não gostava e pronto.Há um ditado popular que diz “água mole em pedra dura, tanto bate até que fura”. E foi o que
aconteceu. Sabe como são as mulheres, nenhum ser é tão capaz de artifícios para a conquista
do que desejam. E assim numa bela tarde de sábado, veio ela com um pequenino bichano em
seus braços. Era negro, destas de dar susto em sexta-feira treze. Seus olhos alaranjados
reluziam como fogo e seu pêlo denso se ouriçou todo com a minha presença. Relevei.
O animal foi crescendo, e eu na minha complacência fui tentando me acostumar com a
estranha presença. Confesso que até tentei uma aproximação, um carinho, um afago, mas não
dava, ficava em meu coração a cisma contra o animal. Não era nada pessoal contra o gato que
ali vivia, no ceio de meu lar, era algo maior, contra toda uma raça.
Ao passo que se passavam os meses via aumentar o afeto entre ele, e minha mulher. Roçava
em suas pernas. Ronronava. Chamava sua atenção. Juro que muitas vezes ficava com a
impressão de que cada olhar dela desviado de mim, o gato olhava-me com deboche. A mulher
dizia-me que estava ficando louco.
Mas cada sentimento dentro de nós, assim existe por algum motivo. Numa noite fria, entrada
do inverno voltava de uma viagem demorada, compromissos de trabalho. A única coisa que
pensava eram os carinhos e o corpo sedento de desejo de minha amada esposa. Abri a porta e
não tardei á beija-la e abraça-la. Mantinha dentro de mim o mesmo ímpeto e desejo de
outrora, e sem demora estávamos nus em nosso quarto.
Embriagado pela paixão não pude perceber que uma estranha figura assistia passivo e calado
aquela cena de amor. Mesmo com o ciúme corroendo seu corpo e sua alma ficou ali, no
silêncio até que os dois amantes adormecessem saciados pelo prazer. Meu corpo relaxou, e
jamais imaginei tal perigo. Só dei conta da presença de tal figura ao sentir meu corpo ser
tocado levemente por patas tão suaves quanto veludo. Abri lentamente os olhos e vi ganhar
forma sobre meu peito a figura do gato negro. Seus olhos enraivecidos tinham uma tonalidade
ainda mais forte de alaranjado. Pensei em espantá-lo, mas faltou tempo. Sorrateiro e rápido
como o melhor dos ladrões em segundos estava com a minha jugular ao seu alcance. Suas
garras afiadas deram apenas um talho. Fatal.
Talvez meus sentimentos e minhas reticências com o animal fosse um aviso. Um aviso que não
escutei. O gosto amargo do sangue esvaindo de minha garganta e a visão turva do gato preto,
com seus olhos de fogo foram a ultima coisa que senti e que vi em minha vida.

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