quinta-feira, 30 de julho de 2009
O Deputado
segunda-feira, 27 de julho de 2009
Consultório
Há neste mundo algo mais aterrorizador que um consultório de dentista? Seu odor característico, o som dos equipamentos em pleno funcionamento faziam minha pressão arterial descer, enquanto aguardava na sala de espera. O atendimento por ordem de chegada me deixava no meio da fila, tempo suficiente para ouvir gritos pavorosos, e a estridente broca perfurando maxilares mal cuidados. O doutor Ricardo Boaventura era novato, na cidade, e alugara um velho casario, onde montou seu consultório, que era secretariado por uma velha de cara rabugenta, e que jamais olhava-nos nos olhos. Cabisbaixa, anotava nome dos pacientes, e os anunciava ao som de uma campainha apertada dentro da sala do dentista. Estranhamente, os pacientes não retornavam pela porta por onde entraram. Um a um eram chamados, e ao toque da campainha outro entrava sem que o anterior "desse as caras" no saguão. Estranhei o fato, mas supus alguma porta de saída, afinal, era uma casa enorme. A fila foi diminuindo, e torturantemente minha vez ia se aproximando. Já podia sentir a broca raspando minhas cáries, a saliva ensanguentada eclodindo de minha boca... Detestava qualquer dentista, e fosse qual fosse, o odiaria mais que a um inimigo. Mas inevitavelmente me era necessário, e quando a voz empolada da secretária me anunciou, um frio abateu-se sobre meu corpo, e uma vontade de dar meia volta instigava meu pensamento. Só não o fiz por orgulho, pois temia a chacota dos que ainda aguardavam. Cidade pequena, todos comentariam meu medo. Desse modo, muito mais por vergonha em demonstrar fraqueza, do que por coragem de enfrentar a cadeira que me aguardava, entrei no local. Primeiramente procurei pela porta de saída, o que não existia. A única porta era a de metal, que dava acesso a uma espécie de câmara frigorífica. Se já havia medo em meu coração, imagine o leitor após esta constatação. "Por onde saíram os outros?" era a única pergunta que me vinha ao pensamento. Absorto nesta questão esclarecedora, não percebi meus punhos e pés atados firmemente à cadeira. Quando o doutor virou-se, minha ultima visão foram os olhos alaranjados do dentista, que lentamente vinha em minha direção com sua cruel broca, que só saciou seu desejo por sangue após atingir meu cérebro, extinguindo meu último suspiro de vida. Próximo. Gritou a secretária. A fila ainda estava grande, mas o doutor resolveria a dor de dente de muita gente, naquela tarde.
quarta-feira, 22 de julho de 2009
sábado, 18 de julho de 2009
A escolha do Cavaleiro
sexta-feira, 17 de julho de 2009
terça-feira, 14 de julho de 2009
A torre da morte.
sábado, 11 de julho de 2009
Reminiscências.
Não sei por quanto tempo fiquei envolto pelas trevas. Talvez apenas o tempo de passagem que levou-me aquele caminho assustador. Talvez por meus atos em vida, não via a tal luz, e o tempo do outro lado revelou-se carregado e tenso. Seria o inferno?
Um anjo, de penugem negras disse-me que não. Mas o parecia. Fosse pelo calor, ou fosse pelos habitantes infectos e de aparência horrível que moravam do outro lado. Tudo remetia-me ao diabo, mas ele não apareceu para cumprimentar-me.
Já a minha própria vida, regressou após a morte, e cada maldito erro ressurgiu das cinzas para vingar-se dum homem, que em vida escolheu vias tortuosas.
Desde os monstros de minha infância, quando torturava gafanhotos e pequenos pássaros, aos mais temidos inimigos, cuja ordem de morte partiram de minha boca, naquele mundo ressucitavam para torturar-me. Lhes garanto que gafanhotos gigantes, e carrascos sabem muito bem como ser incovenientes num mundo, onde apenas uma pessoa sentia dor: eu.
De todas as formas meu corpo,ou minha alma, sei lá, foi fatiada, feita em pedaços, esmigalhada... De forma que jamais alguém em vida poderá saber que tal dor descomunal possa ser possível.
Enquanto pagava por cada crime naquele traçado tortuoso e longo, apenas uma atitude martelava meus pensamentos, para quem sabe relembrá-los noutra encarnação: Jamais cometeria suicídio novamente.
quarta-feira, 8 de julho de 2009
segunda-feira, 6 de julho de 2009
Fim.

Quando o televisor saiu do ar, jamais imaginávamos o tamanho do problema que recairia sobre este planeta e seus moradores. Sem sinal de telefone, ou de internet. Ou seja, tudo que dependesse de nossos modernos satélites estavam em pane, e o que deixava qualquer cidadão mais apavorado, era a falta de comunicação, e a ignorância do que acontecia. Mesmo que se nossos governantes tivessem tentado alguma forma de nos informar á calamidade que se debruçava sobre nós, não conseguiriam. Foram dias difíceis até o nosso fim. Sim, estamos todos mortos, inclusive o narrador que voz fala. Fui apenas indicado por um arcanjo para que deixasse esta mensagem, pois havia astronautas em nossa estação espacial, e quem sabe, haverá uma esperança na continuidade dos homens. Quando o sol desapareceu, imaginávamos algum problema com a grandiosa estrela. Enfim ela teria se cansado dos planetas que gravitam em sua órbita. Mas não era bem o que acontecia. Se não estou enganado, foram cerca de três semanas sem que a luz do dia radiasse o hemisfério sul. Depois dos primeiros dias, o temor passou a tomar conta de cada um ser vivente e pensante. O silêncio da Nasa era encarado com mau sinal por leigos como eu que esperavam trancados em suas casas por alguma luz sobre o que estava acontecendo no espaço sideral. Mas nenhuma palavra foi pronunciada. Na terra, tomados pelo desespero, saques, anarquia social, e tantos outros problemas faziam com que as forças militares tomassem as ruas. Mas aqui no Brasil, o exército não foi suficiente para controlar milhões de pessoas acuadas como ratos em sua toca. Eu tentei manter a calma, embora estivesse difícil de controlar. Quando os três ônibus espaciais americanos decolaram ao espaço, e concomitantemente coincidiu com o desaparecimento do presidente Barack Obama e sua família, ninguém mais conseguiu controlar os instintos animais reprimidos em algum lugar de sua mente. Do suicídio, individual ou coletivo, das pregações religiosas, e das inquisições em busca de culpados, das oferendas que remetiam a nossos tempos mais remotos... O planeta transformara-se num verdadeiro inferno. Por isso a pequena Pantano Grande não diferia do resto do mundo. Estavam todos loucos. Por dias fiquei com minha família, trancado dentro de casa e quando ela deixou de ser segura, entramos na camionete se seguimos para o campo. Até este momento meu coração cristão, tomado pelo instinto de sobrevivência levara-me a matar mais de cinqüenta lunáticos. As balas da pistola 38 escassearam com rapidez. Andamos por quase um dia inteiro. Apenas por estradas vicinais, e só paramos quando o combustível terminou. Estávamos longe de tudo. As crianças choravam, e minha esposa caía em desespero. Estava difícil manter a situação. Exaustos dormimos. Fui o primeiro a acordar quando uma das teias da criatura monstruosa atingiu o pólo sul, dizimando em poucos segundos cinco por cento da terra. O desequilíbrio alterou toda a gravidade, e a camionete flutuou por primeiro e em seguida foi nossa vez. Ainda deu tempo de cairmos novamente no chão, até que as patas da criatura, com um diâmetro de área equivalente aos estados do sul e do sudoeste do Brasil nos amassaram como se fossemos bactérias. Sempre pensava na grandiosidade do universo. Fazia parte de minha doutrina como professor de filosofia. Noutras buscava entender a arrogância humana frente a algo tão misterioso, já que sempre soube que não passávamos de uma pequena engrenagem num sistema monumental. Porém jamais poderia imaginar a existência de aracnídeo como aquele. Perdida no espaço, o primeiro ponto para ele se afirmar tinha de ser justamente nosso planeta. Talvez o monstro sequer soubesse o mal que nos cometia, mas a terra literalmente explodia a cada movimento seu. Talvez ele até tenha conseguido afirmar-se para buscar impulsão e voltar para de onde viera. Infelizmente não tenho tal resposta. Apenas deixo esta mensagem para caso tenha havido sobreviventes, para que no futuro tomem muito cuidado com aranhas espaciais.
sábado, 4 de julho de 2009
Naquele dia não me viam

Não sei por qual motivo naquela manha despertara invisível. Sim, meus desejos de meninice se concretizaram em plena sexta-feira. Ninguém podia ver-me, e eu logicamente tornei-me um semideus, louco para realizar meus secretos desejos os quais nunca havia imaginado que poderiam sair do campo da imaginação.
Não que fosse um dia especial. Para uns até podia ser azar, mas a mim, o treze daquela sexta-feira trouxera foi muita sorte. O sol como de costume invadia a janela do pequeno apartamento, onde moro sozinho. Ele deslizava lentamente até chegar a meu rosto, e cutucar-me, fazendo-me acordar.
Da cama ao banheiro, ao quarto novamente, e vestido em menos de dez minutos, estava pronto para ir trabalhar. Até então nada de diferente havia percebido. Tudo ocorria normalmente como aos outros dias. Mas quando passei pelo Seu Valdir, porteiro do prédio percebia que alguma coisa estava diferente. Pela primeira vez em três anos ele se negara em cumprimentar-me. Nunca havia me negado um bom dia. E mesmo quando retornei, para tentar puxar alguma conversa o olhar do velho homem se mantinha distante, como se eu não estivesse ali. “Ficou doido, pobre homem.”
Cismado com o fato segui meu caminho, pois estava atrasado, e por muito pouco não perco o ônibus que me levaria ao trabalho. Quando Cris embarcou no ponto seguinte, fui a sua direção, para comentar o acontecido. No entanto estranhamente, ela também me ignorou. Naquela altura do dia, ainda não sabia da sorte que caía sobre mim, e praguejava aquela data azarada. Era como se todos os meus conhecidos estivessem de alguma forma me pregando uma peça. Eu não simplesmente não existia.
Irritado sequer despedi-me de minha amiga, e fui direto ao escritório. Porém, voltou a ocorrer a mesma situação. Claudete, a recepcionista, que me recebia sempre de sorriso largo – pois afinal não sou de se jogar fora – sequer dirigiu seu olhar esmeraldino em minha direção. Isto foi á gota d’água. O desdém de Claudete não poderia passar em brancas nuvens. Fui até ela, e desejei-lhe bom dia, duas ou três vezes... E nada. Ela não me respondia. Não me olhava. Eu não estava ali.
Como não podia crer que todos os meus amigos pudessem confabular tamanha brincadeira, Claudete fez-me perceber que algo estranho ocorria com a minha pessoa. E logo deduzi que naquela manhã eu amanhecera invisível. Era esta a resposta? Não tinha toda a certeza. Ainda cogitava qualquer brincadeira.
Mas minha mente traquina logo descobriu uma maneira de encontrar uma resposta. Meu Chefe. Se fosse uma brincadeira, por certo que ele não seria um dos participantes. Então sem cuidado algum fui ao elevador, e segui até o décimo primeiro andar. Ninguém me cumprimentou. Não estranhei, afinal, naquele dia, isto já era normal.
Quando cheguei ao temível andar, invadi-o sem cerimônias. A secretária nem me olhou, ou perguntou o que desejava. Nunca em três anos de trabalho, eu tivera tanta liberdade. Entrei na sala do chefe e ele estava lá. Enroscado numa loira que gemia como gata no cio. Pareciam dois contorcionistas, pela quantidade de movimentos que faziam sobre o sofá encouraçado. Para tirar qualquer dúvida, bati palmas. E eles não acusaram minha presença. Então naquele exato momento todas minhas questões se resolveram com uma única resposta. Eu estava invisível. Sorri obviamente.
Nem minhas gargalhadas atrapalharam os dois que prosseguiam o coito de forma muito calorosa. Nunca fui de espiar, mas não é todo dia que se entra na sala do chefe e vê-se aquele tipo de coisa. Fiquei ali observando o desempenho dele, que cá entre nós, falava mais do que fazia. Só mesmo o dinheiro poderia explicar a atração daquela bela mulher por ele.
Com aquela descoberta fascinante, a porção criança, e a porção devassa se apossaram de meu ser. O devasso fez com que pelo dia inteiro entrasse em: banheiros femininos, provadores, e outros locais que apenas mulheres entram. Posso lhes garantir que em um “sexshop” presenciei cenas impublicáveis.
Já a porção criança, me levou a cinema sem pagar entrada. Viajar pela cidade sem pagar passagem, espionar conhecidos, roubar sorvete, etc...
Quando dei por conta a sexta-feira escorria para seu final. Mas antes pude passar na pastelaria, tomar chope sem pagar e comer o pastel do português. Era uma delícia, e caro. Como estava invisível, levei cinco. Na portaria percebia que continuava invisível, pois Manoel, o porteiro da noite também não me cumprimentara.
“Por quanto tempo ficarei assim?” Era uma pergunta relevante, pois imaginava que tal situação fosse transitória. Cansado pelo dia de aventura e traquinagens favorecidas pelo novo dom, debrucei-me sobre o sofá. Tomar ou não tomar banho? Eis minha questão “cheiquesperiana” para aquele final de dia. Estava cansado demais, logo, entre o corredor que levava para o quarto e o que levava ao banheiro, optei pelo primeiro.
Não deveria ter aberto aquela porta. Talvez continuasse a imaginar ser invisível. Porém, já havia o feito, e a maçaneta girando e empurrando a madeira de modo que abria a visão para minha cama revelo-me numa situação embaraçosa, afinal, jamais eu estivera invisível, já que meu corpo permanecia imóvel sobre a cama, gélido, e completamente morto, exatamente como amanhecera naquele dia.